O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) acolheu parecer do Ministério Público Federal (MPF) e negou recursos do município de Santarém, no Pará, e de um particular para manter os efeitos da sentença que anulou a venda de um lote localizado em área reivindicada pela Associação dos Moradores Remanescentes de Quilombo do Arapemã. A Corte manteve, ainda, a determinação para que o município realize a titulação do território correspondente no prazo de 24 meses.
O lote vendido tem 8 mil metros quadrados e está inserido numa área cuja certidão de autorreconhecimento como território quilombola foi emitida pela Fundação Cultural Palmares em 2007. Posteriormente, em 2011, foi publicado relatório antropológico de identificação, constando planta e memorial descritivo, cadastro das famílias e levantamento fundiário do local.
Atendendo a uma recomendação do MPF, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) notificou a Prefeitura de Santarém em 2013 sobre a disponibilização da área para estudo para titulação quilombola. Mesmo ciente da situação, o ente municipal realizou, no mesmo ano, a venda de um lote do local para um particular.
Após tentativas frustradas de acordo, o Incra ingressou, em 2015, com uma ação na Justiça Federal de Santarém pedindo a nulidade da transferência do imóvel, o que foi atendido na primeira instância e, agora, mantido no TRF1, após negativa dos recursos de apelação do município e do particular envolvidos na transação.
Manifestação acolhida – A decisão vai no sentido de parecer do MPF, que entende que a venda da área em questão violou um direito fundamental da comunidade tradicional, cujo reconhecimento é incontroverso tanto pelas certidões emitidas em seu favor, quanto pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).
O MPF sustenta que o princípio da “consciência da própria identidade” está assentado na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. De acordo com a norma, Estado nenhum tem o direito de negar a identidade de um povo que se reconheça como tal. Para o procurador da República Ubiratan Cazetta, que assina o parecer, “é patente a nulidade do negócio jurídico de compra e venda firmado pelo município de Santarém acerca de bem imóvel que integra o território nacional”.
O processo retorna agora para o juízo de origem para cumprimento dos efeitos da sentença: o cancelamento do registro de transferência da área negociada e a abertura de prazo para que o município de Santarém restabeleça a área total do território quilombola, que tem cerca de 3,15 mil hectares.
Fonte: MPF