Originário de solos de várzea, igapó e terras firmes próximas a áreas úmidas, o açaí é a joia nutritiva da Amazônia. Antes consumido predominantemente na região norte, hoje o fruto é conhecido mundialmente, devido às suas propriedades nutricionais e versatilidade culinária, além da utilização na indústria cosmética. Na produção, o Estado do Pará é protagonista disparado: 90,4% do açaí do Brasil foi produzido no Pará em 2022, o equivalente a de 1,7 milhão de toneladas.
Considerando o destaque paraense e a importância econômica do fruto para a região, a Diretoria de Estudos e Pesquisas Socioeconômicas e Análise Conjuntural (Diepsac) da Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa) lança a Nota Técnica “Conjuntura Econômica do Açaí 2024”. O estudo explora o potencial produtivo do fruto dentre os estados e municípios brasileiros, além de abordar detalhes da exportação no Pará, empreendimentos, mercado de trabalho e um dado inédito sobre os municípios paraenses mais especializados no cultivo e produção de açaí.
Conforme Marcio Ponte, diretor da Diepsac, o estudo desenvolvido busca colaborar com o atual estágio de discussões a respeito do desenvolvimento desta atividade produtiva no Estado. “Entendemos, a partir desta pesquisa, que a exploração em cadeia do açaí não apenas enriquece a biodiversidade local, mas também impulsiona a economia regional, evidenciando-se como um dos principais produtos de destaque para o desenvolvimento econômico sustentável na região”, analisa.
PRODUÇÃO – O cenário da produção de açaí no Brasil revela uma ascensão notável ao longo das últimas décadas. Entre 1987 e 2022, houve um aumento notável, com a produção passando de 145,8 mil toneladas para impressionantes 1,9 milhão de toneladas, um aumento de mais de 13 vezes em um período de 36 anos. Atualmente, o açaí cultivado representa a parcela dominante da produção nacional, respondendo por impressionantes 87,3% do total. Grande parte deste feito está diretamente ligado ao Pará.
Historicamente, o Pará é o primeiro colocado entre os maiores produtores brasileiros, enquanto o Amazonas ocupa a segunda posição. Mas sempre houve uma discrepância na produção do fruto entre os dois estados. A partir de 2015, com a implantação do sistema de açaí cultivado no país, a diferença cresceu ainda mais. Essa disparidade ressalta não apenas as práticas distintas entre cultivo e a infraestrutura agrícola nos dois estados, mas também a importância do Pará como líder incontestável na produção de açaí no Brasil.
Em 2022, quatorze estados brasileiros contribuíram para a produção de açaí, com destaque para o Pará, que manteve sua posição de liderança com 90,4% da produção. Em seguida, o Amazonas e o Maranhão ocuparam, respectivamente, o segundo e terceiro lugares, contribuindo com 7,4% e 1,1% da produção total do país. Nessa análise, o Pará superou a média nacional de 13,8% em crescimento, fechando 2022 com mais 14,1% de produção. Esse percentual significa um incremento bruto de 217,8 mil toneladas, gerando o maior impacto positivo para o país.
Nove, dos dez municípios que mais produzem açaí no Brasil são do Pará. O município de Igarapé-Miri desponta no topo do ranking, contribuindo com 21,7% da produção nacional, totalizando 422,7 mil toneladas. Os outros dois municípios mais representativos também são paraenses: Cametá, com 8% da produção, e Abaetetuba, com 5,8%. No ranking de maior crescimento de produção no período de um ano (2021-2022), os municípios em destaque foram Mocajuba (514,4%), Bagre (115,1%) e Anajás (40,1%). Todos esses municípios foram os principais responsáveis por impulsionar o resultado médio nacional.
EXPORTAÇÃO – Os produtos exportados derivados do açaí paraense saltaram, exponencialmente, de menos de 1 tonelada em 1999 para pouco mais de 61 mil toneladas em 2023. Já no Amazonas, os derivados do açaí passaram de menos de 1 tonelada para 57 toneladas, no mesmo período. Quanto ao valor exportado, neste, observou-se que os produtos derivados do açaí paraense saltaram de US$ 1,00, em 1999, para quase US$ 45 milhões, em 2023. Na economia amazonense, os derivados do açaí passaram de US$ 692, em 2002, para pouco mais de US$ 93 mil, no mesmo período.
Outra valorização expressiva está nos preços praticados no mercado internacional. A nota mostra que entre 1999 e 2023, os preços dos produtos derivados do açaí paraense aumentaram em mais de 5.000%, indicando um forte processo de agregação de valor ao açaí do Pará comercializado com o setor externo.
“Outro ponto importante a ser destacado é que o Pará é o maior produtor do mundo e uma referência internacional do açaí, mas outras regiões do país de clima até oposto ao nosso estão plantando açaí – e não queremos ver a história se repetir como aconteceu com a borracha, levada para a Malásia pelos ingleses e aniquilando nossa economia da borracha. Precisamos certificar, criar um selo, identificar geograficamente, capturar carbono, fazer manejo, investir em pesquisa e tecnologia, construir um Museu do Açaí e contar sua história e sua cultura, entre tantas potencialidades que essa fruta e sua identidade podem nos proporcionar econômica e culturalmente”, complementa Márcio Ponte.
O fruto é responsável por novos empreendimentos e novas frentes de trabalho
Os três últimos Censos Agropecuários mostram aumento significativo de empreendimentos associados à produção de açaí no Estado. De quase 13 mil, em 1996, o quantitativo fechou 2017 com pouco mais de 81 mil estabelecimentos, o que representou um aumento de 533% em 22 anos. Em comparação à realidade econômica do Amazonas, os empreendimentos do Pará representaram quatro vezes o número existente naquele estado, segundo o último Censo.
No mercado de trabalho ligado ao açaí, o Pará apresentou variação positiva da ordem de 864,5% no número de vínculos empregatícios formais, entre os anos de 2010 e 2022. Entre 2021 e 2022, a variação, neste sentido, foi de 107,6%, passando de 288 para 598 vínculos, um aumento de 310 postos formais. Estes dados expõem a crescente participação do cultivo de açaí na geração de empregos formais. Com base em cálculos estatísticos abordados na nota técnica quanto ao estoque de vínculos formais no ano de 2022, foram criados 598 empregos diretos e 2.536 indiretos no cultivo de açaí ao longo de toda a cadeia produtiva do fruto. A soma dos vínculos totaliza, portanto, 3.143 empregos gerados no setor.
CRÉDITO RURAL – A análise do crédito rural fornecido aos produtores ajuda a compreender as prioridades na produção de açaí por estado. Há uma disparidade significativa entre o Pará e o Amazonas, maiores produtores do fruto no país. Os números mostram que o Pará obteve um montante de recursos destinados ao crédito rural cerca de trinta vezes superior ao destinado ao Amazonas no período analisado.
Na distribuição das linhas de crédito, em 2023, no Amazonas, a linha de custeio predominou, representando 78,5% do crédito total, enquanto a linha de investimento contribuiu com os restantes 21,5%. Por outro lado, no Pará, a alocação de recursos foi significativamente diferente, com a linha de crédito de investimento representando a maioria, ou seja, 81% do total destinado à cultura do açaí. Em contrapartida, a linha de custeio foi responsável por 19% do montante total disponibilizado.
Os dados evidenciam variação na estratégia de financiamento, destacando a preferência por diferentes tipos de investimento na produção de açaí. Enquanto no Amazonas o foco parece estar mais no financiamento das despesas operacionais da produção, no Pará há maior orientação para investimentos de longo prazo na expansão e melhoria da infraestrutura para a cultura do açaí.
ESPECIALIZAÇÃO – O estudo apresenta ainda um dado inédito sobre os municípios paraenses com potencial de especialização no cultivo e produção de açaí, considerando a instalação de novos sistemas técnicos, inovativos e tecnológicos no campo, para expandir níveis de intensidade e produtividade no setor. Sendo assim, em 2022, 14 municípios apresentaram níveis acima da média produtiva. Dentre esses municípios, Igarapé-Miri, Bagre e Ponta de Pedras estão no topo da especialização produtiva do açaí. Já o município de Anajás apresentou maior aceleração e intensidade no processo de especialização, seguido de Mocajuba.
A conclusão da análise, portanto, considera que estes 14 municípios altamente especializados na produção de açaí devem ser priorizados nas tomadas de decisões de investimentos, seja por agentes públicos que objetivem o desenvolvimento da cadeia produtiva dessa cultura, seja por agentes privados que desejem a expansão de sua atuação no ramo do açaí.
“Esse estudo sobre açaí mostra claramente a grande liderança que o Pará tem na produção do açaí, mas também nos mostra que, apesar dessa grande produção, há necessidade da diversificação dos produtos a serem ofertados a partir deste fruto, a partir desta cadeia produtiva. A verticalização, a criação de novos produtos, vai garantir não só a liderança na produção, mas também a liderança na exportação e a maior agregação de valor a este produto da bioeconomia paraense”, avalia o presidente da Fapespa, Marcel Botelho.
Fonte: Agência Pará