‘Talha-mar’ volta a voar e devolve à Aramanaí uma tradição que atravessa gerações

A comunidade de Aramanaí, no município de Belterra, no oeste do Pará, vive neste sábado (20) um momento histórico de reencontro com sua própria memória cultural. Às 18h, na área externa da sede paroquial de Nossa Senhora das Dores, o Cordão do Pássaro Talha-mar volta a se apresentar, resgatando uma tradição criada pelos antepassados e vivida na infância por muitos dos atuais moradores mais antigos da vila do Baixo Tapajós.

O retorno do Talha-mar começou de forma quase silenciosa, a partir de uma pesquisa de campo realizada pela mestra em Letras Fernanda Lima Aguiar. Durante uma entrevista, uma das comunitárias reviveu lembranças da infância ao cantar músicas aprendidas com o pai, que havia sido músico do cordão. O passado ganhou forma quando ela revelou um caderno antigo, onde estavam registrados trechos do roteiro, personagens e canções que já não conseguia mais recordar por completo. A partir dali, memórias individuais passaram a se transformar em um projeto coletivo.

O apoio necessário para tirar o cordão do papel veio com os recursos da Lei Aldir Blanc, por meio da Secretaria Municipal de Cultura de Belterra, que decidiu incentivar projetos culturais no município. Fernanda optou por não se afastar da comunidade após concluir sua pesquisa e inscreveu a proposta de resgate do Cordão do Pássaro Talha-mar, dando início a um processo que mobilizou moradores de diferentes gerações.

A associação de moradores acolheu a iniciativa e contou com o envolvimento direto de pais, que incentivaram os filhos a participar dos ensaios. Antigos brincantes, hoje senhores e senhoras, muitos deles músicos do antigo cordão, também decidiram voltar a integrar a apresentação, revivendo sons, gestos e histórias que marcaram a juventude de Aramanaí. Após meses de dedicação e ensaios, o Talha-mar retorna ao cenário cultural da comunidade como símbolo de resistência e pertencimento.

O Cordão de Pássaro, também conhecido como Pássaro Junino, é uma manifestação cultural típica do Pará que reúne teatro popular, música e dança. Seus enredos costumam girar em torno de um pássaro que enfrenta perigos, doenças ou desaparecimentos, acompanhado por personagens como caçadores, curandeiros, figuras cômicas e fantásticas. As apresentações misturam ritmos amazônicos, como o carimbó, com cantos teatrais, cenários coloridos e figurinos criativos, fortalecendo o espírito festivo e comunitário.

Reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado desde 2009, o Cordão de Pássaro representa mais do que um espetáculo. Em Aramanaí, o retorno do Talha-mar simboliza a passagem de um saber tradicional dos mais velhos para os mais jovens, garantindo que a história, a arte e a identidade cultural da comunidade continuem vivas e em movimento.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *