O Ministério Público Federal (MPF) recomendou a órgãos públicos, nesta segunda-feira (17), que adotem medidas urgentes para que seja concluída, dentro de um ano, a regularização das terras do Quilombo Passagem, em Monte Alegre, no oeste do Pará.
Entre as medidas recomendadas estão as necessárias para garantir a vida, a segurança e a integridade física e psíquica das famílias quilombolas e da equipe responsável pelos trabalhos de campo para a regularização.
Segundo informações levantadas pelo MPF, por três vezes, em 2014, 2018 e 2022, não quilombolas impediram técnicos do Instituto de Terras do Pará (Iterpa) de realizar os trabalhos de campo. O impedimento aos trabalhos foi feito por meio de ameaças e intimidações.
A Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) informou ao MPF que o Iterpa não pediu apoio policial para os trabalhos de campo.
Para o MPF, a situação tende a ficar ainda mais grave, tendo em vista relatos de ameaças registrados pela instituição.
Violações de direitos – A comunidade quilombola aguarda a regularização das terras há quase 20 anos. Na recomendação, o MPF destaca que a Constituição assegura a todos o direito fundamental à razoável duração do processo e aos meios que garantam a agilidade de sua tramitação.
Enquanto os quilombolas aguardam a titulação, não quilombolas solicitaram ao Iterpa a criação de um assentamento na área. Apesar de não ter sido realizada consulta prévia, livre e informada aos quilombolas, conforme estabelece a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – que tem força de lei no Brasil –, o procedimento para a criação do assentamento segue tramitando.
O procurador da República Vítor Vieira Alves também destaca que, em julgamento de um caso semelhante, a Corte Interamericana de Direitos Humanos considerou que o Brasil violou o direito à proteção judicial e o direito à propriedade coletiva.
O MPF ressaltou, ainda, fala da relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a situação das pessoas defensoras de direitos humanos, Mary Lawlor. Segundo a relatora, que esteve no oeste do Pará em 2024, o direito à terra é a chave para a proteção de pessoas defensoras de direitos humanos.
Detalhes da recomendação – Ao Iterpa, por meio do presidente da instituição, Bruno Kono, o MPF recomendou:
a conclusão, no prazo de um ano, do procedimento de titulação do Quilombo Passagem, emitindo título de propriedade coletiva em nome da Associação de Remanescentes do Quilombo Passagem (Arqpassagem);
o acionamento da Segup e da Polícia Militar sempre que necessário para garantir a vida, a segurança e a integridade física e psíquica das lideranças e dos membros da comunidade quilombola Passagem, durante todo o processo de demarcação de seu território, e dos servidores do próprio Iterpa, nas etapas de campo desse processo;
a notificação da Arqpassagem para participar de todo o procedimento de titulação do território quilombola de Passagem, consultando-a em todas as etapas do procedimento; e
a extinção do procedimento administrativo instaurado para instruir a criação de um projeto de assentamento agroextrativista na mesma área do território quilombola de Passagem, por causa da falta de consulta prévia, livre e informada à comunidade quilombola e da ordem de preferência estabelecida no artigo 17, I, da Lei Estadual nº 8.878/2019.
Ao secretário de Segurança Pública do Pará, Ualame Machado, o MPF recomendou:
a adoção de todas as medidas necessárias para garantir a vida, a segurança e a integridade física e psíquica das lideranças e dos membros da comunidade quilombola Passagem, durante todo o processo de demarcação de seu território, e dos servidores do Iterpa, nas etapas de campo do processo; e
a elaboração de planejamento para reforço da segurança na comunidade quilombola Passagem antes, durante e após as etapas de campo do processo de demarcação e titulação.
Sobre recomendações – Recomendações são instrumentos do Ministério Público que servem para alertar sobre a necessidade de providências para resolver uma situação irregular ou que possa levar a alguma irregularidade. Embora não possua caráter obrigatório, visa a solução do problema de forma extrajudicial. A omissão na adoção das medidas pode resultar em ações judiciais cíveis e penais contra os agentes públicos responsáveis.
Fonte: MPF