Terror no Eixo Forte: Invasão armada em comunidade tradicional expõe avanço da especulação imobiliária em Santarém

Empreendimentos de luxo ameaçam indígenas e quilombolas na região de Alter do Chão; casas são destruídas e moradores vivem sob ameaça.

A região conhecida como Eixo Forte, que abrange áreas de comunidades tradicionais, entre elas, a comunidade de São Raimundo, às margens da estrada para Alter do Chão, em Santarém, no oeste do Pará, vive dias de tensão, medo e indignação. No último dia 8 de julho, homens armados invadiram propriedades pertencentes a famílias indígenas e quilombolas, destruíram casas e ameaçaram moradores, sem mandado judicial e sem respaldo legal.

A denúncia é grave: uma advogada, que se apresentou como oficial de justiça, teria tentado dar aparência de legalidade à ação violenta. Na prática, o que ocorreu foi uma violação brutal de direitos humanos, um ataque direto às populações originárias e tradicionais, que há décadas ocupam, cultivam e cuidam daquelas terras.

Segundo informações apuradas pela reportagem, a ação teria sido articulada por uma empresa do ramo de empreendimentos imobiliários, interessada em transformar a área, rica em natureza, cultura e ancestralidade, em terreno de luxo para a elite, dentro de um processo agressivo de especulação imobiliária que há anos avança sobre a região.

Com a força bruta dos tratores e sob a mira de armas, os invasores trataram as terras como se fossem desocupadas, ignorando a presença de famílias, histórias, raízes e direitos legítimos. O cenário é de destruição: casas ao chão, roças devastadas, moradores aterrorizados.

“Eles acham que ali é terra sem lei. Mas não é. Ali vivem pessoas, vivem comunidades que resistem há gerações”, afirma um morador que, por medo de represálias, pediu para não ser identificado.

A Comunidade de São Raimundo, localizada dentro de uma Área de Proteção Ambiental (APA) e reconhecida por abrigar povos indígenas e comunidades quilombolas, está sob ataque explícito, sem que até agora haja investigação oficial ou responsabilização concreta pelos atos cometidos.

Nas redes sociais, a repercussão foi imediata. Manifestações de apoio e solidariedade se multiplicaram, vindas de professores, defensores de direitos humanos, lideranças comunitárias e cidadãos comuns. Uma das vozes que se levantaram com firmeza foi a do professor e analista judiciário Márcio Pinto, que escreveu:

“Estamos diante de um projeto que visa transformar áreas de assentamento e de proteção ambiental em moeda de luxo para poucos, passando por cima de quem constrói a vida a partir da terra. A luta dessas famílias não é só por suas casas. É uma luta por dignidade, por justiça, contra a lógica predatória de uma especulação que enxerga a floresta como mercadoria e os moradores como obstáculos”, escreveu.

A violência praticada em São Raimundo não é um caso isolado. É parte de uma engrenagem maior, que tem operado silenciosamente, mas de forma implacável, em Alter do Chão, no Lago Verde, na Ponta do Muretá, no Mararu, na Urumari, em diversas partes do oeste do Pará. A valorização da terra, impulsionada pelo turismo e pelo desejo de setores privilegiados em se apropriar do território, vem expulsando os verdadeiros donos da terra: os povos que nela vivem e resistem.

Frente a esse cenário, está sendo organizado um “Acampamento de Luta” no território de São Raimundo, com o objetivo de proteger a comunidade, fortalecer as resistências locais e denunciar nacional e internacionalmente os crimes que ali estão sendo cometidos. A mobilização inclui movimentos sociais, entidades de direitos humanos, ambientalistas e parlamentares.

O silêncio dos poderes públicos diante da violência escancarada levanta suspeitas e exige respostas. Onde estão as investigações? Quem autorizou a presença de seguranças armados em áreas reconhecidamente ocupadas por populações tradicionais? Onde está a responsabilização da empresa envolvida?

Essas perguntas precisam de respostas urgentes. O que está em jogo não é apenas o direito à moradia. É o direito à existência de modos de vida, à manutenção da floresta viva, à soberania popular sobre o território.

A luta das comunidades do Eixo Forte, como São Raimundo, não é local, é coletiva. É uma luta por justiça, por meio ambiente, por democracia e pelos direitos humanos. A sociedade santarena, os órgãos ambientais, a Defensoria Pública, o Ministério Público, os movimentos indígenas, quilombolas, urbanos e ambientais precisam se unir para impedir que a grilagem de luxo disfarçada de empreendimento prospere.

A redação de O Quarto Poder tenta contato com a empresa, mas até a publicação desta matéria, não conseguimos. O espaço segue aberto para os devidos esclarecimentos.

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