Uma pesquisa mostra que o conhecimento dos pescadores sobre a cadeia alimentar de peixes e predadores é de fundamental importância para compreender as interações tróficas e produz dados precisos e eficazes sobre os peixes e os seus principais predadores nos rios Tapajós e Tocantins, na Amazônia brasileira. De acordo com a pesquisa, ambientes de água doce estão entre os mais alterados e ameaçados do mundo.
Informações do conhecimento dos pescadores podem ser incorporadas ao manejo e conservação dos recursos naturais, especialmente em espécies e ecossistemas ameaçados pela atividade humana e que carecem de dados ecológicos. Os estudos comprovam o enorme conhecimento que pescadores têm sobre os peixes e suas interações ecológicas com outras espécies e todo o ecossistema.
Informações obtidas de entrevistas com 98 pescadores corresponderam com modernas análises de isótopos estáveis de 63 amostras de peixes. Além disso, o estudo revelou fontes de informações desconhecidas da literatura cientifica sobre animais predadores. A falta de dados e recursos, tanto financeiros quanto humanos, é um problema que afeta a conservação dos recursos naturais. Dados sobre os níveis tróficos, ou seja, a posição que peixes e predadores ocupam nas cadeias alimentares, podem contribuir para compreender e monitorar as mudanças que estão ocorrendo nos ambientes.
Os dados revelam que existem diferentes maneiras de obter conhecimento sobre os alimentos consumidos pelos organismos, como análises químicas (isótopos estáveis), bem como o conhecimento tradicional que os pescadores obtêm durante suas interações diárias com os organismos.
Para o professor da Ufopa, lotado no campus de Oriximiná, Gustavo Hallwass, um dos participantes da pesquisa, “esse trabalho novamente comprova o enorme conhecimento que pescadores têm sobre os peixes e suas interações ecológicas com outras espécies e todo o ecossistema. Esse conhecimento tradicional é passado através das gerações e pode ser considerado um patrimônio cultural das populações ribeirinhas amazônicas, devendo ser respeitado, preservado e considerado em políticas públicas relativas ao manejo e conservação dos recursos naturais”.
Uma das pesquisadoras que liderou o estudo, a doutoranda em Ecologia, Paula Pereyra, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, explicou que a pesquisa foi realizada a partir de entrevistas com pescadores para tentar compreender quais os alimentos dos peixes e quem são os organismos que se alimentam deles. “Nós realizamos análises químicas, chamadas de ‘análise de isótopos estáveis’, técnica que mede o nível trófico dos peixes em laboratório, que seria a posição que eles ocupam nas teias alimentares. Além disso, a partir de entrevistas, fizemos cálculos, baseado nas informações do conhecimento dos pescadores e comparamos com os dados obtidos através das informações das análises realizadas em laboratório”.
O resultado, segundo a pesquisadora, é que os pescadores têm conhecimento muito detalhado a respeito da biologia dos peixes. “Os dados que os pescadores informaram foram muito próximos ao compararmos com a análise química. Por que é importante conhecermos os níveis tróficos? Porque estão ocorrendo muitas mudanças nos ambientes e a partir das interações tróficas entre os organismos, nós podemos avaliar e detectar essas mudanças”, afirmou, ao acrescentar que existem pouquíssimos estudos, especialmente sobre os predadores, “estudos sobre os recursos alimentares de predadores maiores são de difícil obtenção, a exemplo dos botos, ameaçados de extinção”.
A pesquisa, ainda segundo Paula Pereyra, foi uma forma de aprender mais sobre o ambiente e os organismos que o habitam. “A ideia foi avançar no conhecimento a respeito das mudanças ambientais, especialmente em rios da Amazônia que requerem estudos, como o Tocantins, um dos mais modificados por ações antrópicas na bacia Amazônica e o Tapajós, que já sofre com a ação dos garimpos ilegais, além de projetos de hidrelétricas que estão para serem implementados. Todos esses fatores podem influenciar os peixes, os predadores e consequentemente as populações ribeirinhas que dependem dos peixes para alimentação”, finaliza.
Além de Paula Pereyra, a pesquisa também foi liderada pelo professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Renato A. M. Silvano e contou com a participação do professor da Ufopa/Oriximiná, Gustavo Hallwass e do professor Mark Poesch, da Universidade de Alberta no Canadá.
Link do artigo, publicado na revista Fronteirs in Ecology and Evolution.
Ascom/Ufopa