No silêncio do dia, em uma das salas do Colégio Equipe, no distrito de Porto Trombetas, município de Oriximiná, no oeste do Pará, falas instrutivas intercaladas com a afinação de notas agudas e estridentes, que muito lembram um instrumento de cordas, anunciam que as aulas de violino já começaram. São as turmas do projeto Orquestra Maré do Amanhã, apoiado pela Mineração Rio do Norte (MRN), por meio da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura. Dos 105 alunos selecionados para participar do projeto, 47 são das comunidades Ajudante, Boa Vista e Moura.
Entre os selecionados do curso de violino, está Camila Siqueira, da comunidade Boa Vista. A rotina da estudante que se prepara para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é dividida entre livros e partituras. “Eu acredito que todo mundo nasce com uma relação com a música. Alguns, claro, preferem se aprofundar. Eu desde criança sempre tive vontade de tocar violão e, quando surgiu a oportunidade de tocar violino, eu logo pensei: ‘por que não?’”, relata.
“Ela tem um objetivo”, destaca a mãe Izonilda Siqueira. A inspetora escolar conta que tem incentivado a filha porque sabe que as oportunidades de hoje são bem diferentes das que ela teve no passado. “Eu não tinha terminado meu Ensino Fundamental, então terminei meus estudos para mostrar a eles que a educação é muito importante”, declara.
Basta atravessar o rio Trombetas para ver que os instrumentos clássicos também têm entoado sonhos no coração do adolescente Renato Figueira. Da Escola Nova Israel, na comunidade Ajudante, o estudante de 14 anos conta que a música o acompanha desde a infância. Começou pelo objetivo de tocar bateria, passou pelo violão e hoje está no aprendizado da viola. A meta agora é descobrir novos caminhos no universo da música clássica, deixando a família ainda mais contente. “Desde a primeira aula, tem sido muito bom. Aprendi os nomes das cordas e o jeito certo de pegar o instrumento. Minha expectativa é de conquistar muito mais e dar orgulho para o meu pai e a minha mãe”.
Mal sabe ele que a mãe, a vendedora Sara Lima, já está toda orgulhosa. E ela entende que para que esses sonhos sejam transformados em realidade, estar ao lado dele é fundamental. “Eu sempre digo: ‘aproveite enquanto estou aqui’. Minha mãe nunca foi ausente, mas somos 10 filhos e ela passava boa parte do tempo trabalhando. Quero dar a ele o que eu não tive”, afirma.
Além dos muros da escola
Com a pandemia da Covid-19, a defasagem de aprendizagem foi uma das heranças deixadas nas escolas, e na comunidade Lago Ajudante não foi diferente. O diretor da unidade de ensino, Edmilson Pereira, explica que projetos como o Orquestra Maré do Amanhã possibilitam o resgate do interesse dos alunos pela aprendizagem. “São iniciativas que têm ajudado as crianças nessa recuperação e desenvolvimento. É o que nós temos observado e discutido em nossas reuniões pedagógicas, o que contribui para pensarmos em alternativas para trazer esses alunos à rotina dos estudos”, comenta.
Matheus Silvestre, professor e coordenador regional do projeto Orquestra Maré do Amanhã – Núcleo Porto Trombetas destaca que os aprendizados estão além dos instrumentos. Segundo ele, a boa relação com os alunos e com os pais se faz necessária durante o processo. “É motivar o aluno e incentivar que o pai também o motive, para que ele possa confiar no professor, sabendo o que os pais estão apoiando. Pregamos o respeito, o saber ouvir e quando falar, além de dar valor ao que está sendo ensinado”, pontua.
Entre mares e rios
O Projeto Orquestra Maré do Amanhã nasceu no Rio de Janeiro (RJ), em 2010. Uma iniciativa de Carlos Eduardo Prazeres, com o objetivo de manter vivo o sonho do pai, o maestro Armando Prazeres, de “Transformar vidas através da música”, já musicalizou um total de 3.500 crianças, adolescentes e jovens. No decorrer dos anos, o projeto já se apresentou em diferentes partes do Brasil e pelo mundo, como na Orquestra Binacional Brasil X Venezuela, no Festival Villa-Lobos, com o conceituado El Sistema, em Caracas. Após seleção em edital de aportes da MRN, a Orquestra Maré do Amanhã desembarcou em Porto Trombetas no ano de 2020.
Este ano, o projeto inicia as atividades, levando o ensino da música clássica às margens do rio Trombetas, o que reforça o objetivo da MRN em ampliar as oportunidades de desenvolvimento para as comunidades as quais a companhia tem interface em vários eixos temáticos, incluindo a cultura. “Ao trazer essa importante parceria, entendemos que os alunos têm a possibilidade de desenvolver tanto suas habilidades artísticas quanto sociais. Nós acreditamos que a educação é o nosso maior legado e conectar o desenvolvimento com a educação e dar ferramentas para que os povos amazônidas se desenvolvam ainda mais, a partir de suas próprias perspectivas, é extremamente satisfatório”, pontua Bianca Bentes, analista de Relações Comunitárias da MRN.
Fonte: MRN