Por Marcelo Thomé*
A falta de investimentos em projetos estruturantes e negócios sustentáveis atravanca a vida da Amazônia e está na raiz da nossa incapacidade de combater as queimadas e deter o desmatamento. A conservação do bioma amazônico não é possível sem o seu manejo como base de uma bioeconomia inovadora e inclusiva, com atividades sustentáveis capazes de gerar escala e oportunidades para todos que vivem nessa grande floresta habitada – são trinta milhões de brasileiros, a grande maioria sem uma qualidade de vida digna da sua humanidade.
As comunidades da Amazônia, por seus modos de vida, legaram ao Século 21 a maior floresta tropical do mundo. E apesar do inusitado que é empreender no “paraíso perdido” descrito por Euclides da Cunha, os setores produtivos da região criaram os meios possíveis para alimentar e abastecer essa população amazônida, além de gerar alguma perspectiva de vida melhorada. Sempre lidamos com queimadas e desmatamento, somando culpas e méritos no trato do bioma, mas o fato que as emissões de gases de efeito estufa dos países industrializados desequilibraram o clima e tornaram essa discussão ultrapassada. O que importa agora é conservar a Amazônia, e se isso não pode ser feito sem o engajamento da sua população, também não pode ser feito sem investimentos externos.
A emergência climática cobra sinergia entre ação global e ação local para conter a devastação da Amazônia, desafio que exige muitos recursos, especialmente financeiros – e nesse quesito a capacidade da iniciativa local é muito limitada. Sem o suporte global é impossível deter o desmatamento, acabar as queimadas e promover qualidade de vida para quem vive na Amazônia. Mas é decepcionante constatar que recorrentes anúncios de aportes bilionários nas florestas tropicais não passam disso: anúncios. Em 2015, com o Acordo de Paris, os países endinheirados anunciaram cem bilhões de dólares por ano para conter o aquecimento global em 1,5ºC. Dispensável listar razões que fazem da Amazônia um destino prioritário dessa grana. Mas até hoje a dinheirama das Nações não causa impacto na Amazônia.
Perseverar é preciso e não se deve deixar de cobrar o financiamento climático, só não podemos apenas esperar. Por assim entender, um movimento de empresários da Amazônia decidiu agir. Essa iniciativa empresarial criou o Instituto Amazônia+21, organização da sociedade civil apoiada pela Confederação Nacional da Indústria e pelas federações de indústria dos nove estados da Amazônia Legal. O instituto atua em colaboração com importantes associados e parceiros dos setores privado e público, instituições, academia e mercado financeiro. Numa frase, a missão do Amazônia+21 é promover negócios sustentáveis, com agenda ESG e foco ODS, conectando todos os tipos de investimentos às melhores oportunidades na Amazônia.
As regras dos bancos e do mercado financeiro não são feitas para a realidade do Norte, tão diferente do Sul e Sudeste. A intricada situação fundiária da nossa região constitui uma barreira quase intransponível para grande parte das operações bancárias. Conhecendo bem esses gargalos, o Instituto Amazônia+21, com a colaboração do Blend Group, criou a Facility de Investimentos Sustentáveis. Trata-se de uma ferramenta inovadora, estruturada em quatro plataformas que incluem investimento, engajamento, assistência técnica e geração de conhecimento. A partir dessa arquitetura ela utiliza de blended finance para viabilizar projetos capazes de gerar escala e produzir impacto na vida de comunidades, com ganhos socioambientais, compliance e retorno financeiro.
A mobilização de capital envolve diversas fontes, sejam investidores individuais, family offices, fundos e bancos de fomento, instituições multilaterais, doadores institucionais ou individuais, governos. Pela combinação de veículos de investimentos e estruturas catalíticas, é possível criar meios para originar projetos, prover assistência técnica, engajar atores relevantes e produzir conhecimento para impulsionar o desenvolvimento local sustentável. A estratégia de operação visa atrair e orientar capital em larga escala, fornecer planejamento e assistência técnica, e implementar uma agenda de recursos filantrópicos para projetos estruturantes. O modelo operacional e financeiro do investimento é submetido a um conselho estratégico, e só depois segue para os veículos de investimento tomarem as decisões finais sobre o aporte de recursos.
A Facility catalisa diferentes tipos de capitais e viabiliza projetos que podem contribuir para uma transformação com respeito aos modos de vida das comunidades, para a conservação de ecossistemas com emissões mitigadas e infraestruturas adaptadas às mudanças climáticas. É uma ferramenta completa. Com segurança jurídica e transparência, os investidores participam de cada etapa dos processos e têm dividendos financeiros e sociais por associação com a bioeconomia, agricultura de baixa emissão, energia renovável, turismo sustentável, água e desenvolvimento territorial.
Insisto lembrar que a Amazônia é uma floresta habitada e milhões de pessoas dependem do seu manejo para comer, trabalhar e viver melhor. Se não vamos conservar o bioma apenas impondo “o que não pode fazer”, também não basta orientar “o que se pode fazer”. É sobre “como fazer” que estamos falando agora, com a Facility de Investimentos Sustentáveis.
Facilitar investimentos é fundamental para conservar o bioma e gerar qualidade de vida para trinta milhões de pessoas que vivem na Amazônia. Uma coisa depende da outra e precisamos conversar sobre isso em espaços como as próximas conferências das Nações Unidas sobre mudanças climáticas em Baku e em Belém, naturalmente.
*Marcelo Thomé da Silva de Almeida, 50 anos, empresário. Arquiteto e urbanista pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), pós-graduado em gestão empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Presidente da Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (FIERO) e vice-presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), onde preside o Conselho Temático de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Coemas). É Presidente do Instituto Amazônia+21.