Estudo aponta que Oriximiná registra mais picadas de cobra que a média nacional

“Bothrops atrox” (conhecida como jararaca-do-norte ou malha-de-sapo): a maior causadora de acidentes na região. Foto: Ediego Batista.

Trabalho de conclusão de curso (TCC) defendido recentemente no Campus Oriximiná chama a atenção para a alta incidência de casos de picadas de cobra na cidade. Para entender o perfil das vítimas de acidentes ofídicos no município de Oriximiná e quais os fatores que afetam o número de acidentes, o aluno do curso de Ciências Biológicas Jorge Emanuel Cordeiro Rocha e os professores Rodrigo Fadini e Samuel Gomides desenvolveram uma pesquisa que traçou o perfil epidemiológico desses casos no período de 2007 a 2021.

Como o estudo foi realizado? – Os autores do trabalho analisaram os dados disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) através do Sistema Nacional de Agravos de Notificação (SINAN), sistema que registra dados desse tipo de acidente em um banco de dados integrado no Brasil e disponível através de plataforma on-line.

O estudo avaliou o número de acidentes por sexo, idade, região do município e se existe correlação entre acidentes ofídicos e a intensidade das chuvas e o índice das cheias dos rios. O número de acidentes com serpentes em Oriximiná é um dos mais altos do Brasil.

No período de janeiro de 2007 a dezembro de 2021 foram registrados 1.345 acidentes ofídicos em Oriximiná, com média de 89,67 acidentes por ano. A incidência média foi de 133,47 acidentes ofídicos por 100 mil habitantes, e esse número de acidentes ofídicos é elevado: cinco vezes mais do que a média nacional e o dobro da média da Amazônia.

Perfil das vítimas – Os resultados indicam que o perfil mais afetado é o de homens adultos (80% das vítimas) que residem no campo (95% dos acidentes ocorrem nessa região); os acidentes são mais comuns na estação chuvosa. A faixa etária concentra-se em pessoas de 19 a 59 anos. A variação dos níveis do rio Trombetas não influenciou no número de casos.

Em geral, a parte do corpo mais atingida são os membros inferiores, em cerca de 87% dos acidentes. Isso indica que, se essas pessoas estivessem calçadas com botas adequadas no momento da picada, se reduziria substancialmente a quantidade de acidentes ofídicos. Isso demonstra a importância das atividades de educação ambiental e orientação para os trabalhadores do campo. Considerando os impactos sociais decorrentes dos acidentes ofídicos, uma política pública de apoio aos trabalhadores rurais (como o fornecimento de perneiras) é importante para a economia do país, já que muito dos acidentados são os responsáveis em garantir a renda familiar.

Quais as serpentes que causam os acidentes? – Apesar de a região de Oriximiná ter cerca de 70 espécies de serpentes registradas dentro dos seus limites, apenas duas delas causam a maior parte dos acidentes. As serpentes que mais causaram acidentes foram Bothrops atrox (conhecida como jararaca-do-norte ou malha-de-sapo), com 84% dos acidentes, e Lachesis muta (conhecida como pico-de-jaca ou surucucu), com cerca de 11%.

Os acidentes causados por serpentes peçonhentas constituem um grave problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Só no Brasil, ocorrem cerca de 30 mil acidentes por ano, e a Amazônia concentra a maior incidência do país. Esse tipo de acidente acomete principalmente pessoas que vivem em zonas rurais e que dependem de atividades no campo para obter a subsistência. Em muitos casos, as pessoas vítimas desses acidentes não possuem acesso eficaz ao atendimento médico e ao soro antiofídico, o que pode gerar sequelas graves e até mesmo a morte.

O orientador do estudo, Prof. Rodrigo Fadini, destaca a importância da pesquisa: “Esse trabalho se destaca pela importância de conhecer o perfil das vítimas e quais as situações em que os acidentes ocorrem. O estudo buscou entender a dinâmica desses acidentes para ajudar a traçar políticas de prevenção que sejam eficientes no combate dessa grave situação que afeta tantos cidadãos do Oeste do Pará”.

Para o Prof. Samuel Gomides, coorientador da pesquisa, a região necessita de estudos dessa natureza: “A Amazônia brasileira está inserida em um contexto de alta diversidade étnico-cultural e carece de informações epidemiológicas robustas que permitam traçar políticas de vigilância e prevenção, de forma a proteger de maneira eficaz a população da região”.

O tempo entre o acidente e o atendimento médico é vital para a recuperação das vítimas. Cerca de 60% das vítimas foram atendidas após três horas do acidente. Quanto mais tempo se passa após a mordida das serpentes, maior a chance de complicações, e a taxa de letalidade eleva-se consideravelmente. Portanto, a adoção de estratégias que diminuam o tempo entre o acidente e o atendimento nas unidades de saúde é fundamental. Todavia, a região carece de estradas, e a maior parte dos trajetos é feita pelos rios e por estradas precárias, que elevam o tempo gasto até o hospital municipal.

“Nossos dados reforçam a necessidade de políticas públicas de educação ambiental e prevenção, como uso de botas e perneiras, principalmente nos meses chuvosos, que coincidem com a época em que as pessoas da região historicamente estão envolvidas em coletas de produtos florestais, como a castanha-do-pará, e quando a maior parte dos acidentes ocorre”, explicam os pesquisadores.

“As serpentes não são vilãs – Eles chamam atenção para outro aspecto, afirmando que as serpentes não são vilãs. É fundamental preservá-las. “Apesar do medo que muitas pessoas têm desses animais, é importante lembrar que a maioria delas não oferece nenhum perigo ao ser humano e nem são peçonhentas. Mesmo as serpentes peçonhentas não atacam os seres humanos de forma intencional. Elas só atacam quando se sentem ameaçadas ou são pisoteadas. Além disso, as serpentes têm um papel muito importante na natureza. Elas ajudam a manter o ecossistema em equilíbrio ao se alimentar das suas presas mais comuns, como roedores, lagartos, anfíbios e aves. Elas também são fontes de alimento para outros animais, como aves de rapina e mamíferos. Caso você encontre uma serpente na sua casa, chame algum agente público ambiental para fazer o resgate do animal”.

Comunicação/Ufopa, com informações dos pesquisadores

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